29 de novembro de 2009

Lecor e a carga de Infantaria 14 em St. Pierre de Irube (13.12.1813)


Tendo lido no blogue Lagos Militar, do João Centeno, que foi lançado um livro acerca do Regimento de Infantaria n.º 14 (Tavira), coordenado pelo Coronel Rui Moura, achei por bem renovar a minha ofensiva bloguista (há muito adiada) com a transcrição de uma carta do então Marechal de Campo Carlos Frederico Lecor (hoje em dia seria Major-General) ao Ajudante General Manuel de Brito Mozinho, acerca do papel do seu comando nos acontecimentos de 13 de Dezembro de 1813, o último dia da Batalha de Nive.

Defronte de Baiona, na França, e durante 5 dias as forças francesas atacaram o Exército Anglo-Português tanto na margem esquerda do rio Nive (de 9 a 12 de Dezembro), como na margem direita (a 13 do mesmo mês).

A Batalha de St.Pierre, como é particularmente conhecida a acção do dia 13, por acontecer junto a St.Piere de Irube, consistiu no ataque francês em 3 sítios defronte dos altos de Mouguerre, em frente a Baiona no lado direito do rio Nive (a oeste, em VilleFranche; ao centro defronte de Horlopo; e a leste, em Vieux Mouguerre). O dia foi particularmente sangrento porque as forças aliadas neste lado do rio - o Corpo de Rowland Hill, constituído pela 2.ª Divisão e pela Divisão Portuguesa, estavam isoladas do resto do Exército Aliado.
Apesar de Wellington ter enviado outras divisões, mal se apercebeu dos movimentos franceses, foram as duas divisões isoladas que resolveram o dia, com os seus próprios recursos.

A Divisão Portuguesa, na reserva, entrou em acção já de tarde, quase ao final da acão, com a sua Brigada do Algarve (Infantaria 2 e 14) de Hipólito da Costa, a preencher uma parte da frente, entre o 71.º e o 50.º Regimentos ingleses (Brigada Barnes, da 2.ª Divisão) que estava em perigo sério de ceder aos franceses.

A acção da Brigada do Algarve nesta zona foi vital para que a linha fosse mantida, e as acções de Infantaria 14 são particularizadas por Lecor, nomeadamente uma carga à baioneta feita pelo 2.º Batalhão do regimento para apoiar o 1.º Batalhão, que estava em apuros. A prova da intensidade destes combates foi que vários generais foram feridos na acção, nomeadamente o próprio Lecor.

Aqui fica então a carta:

Illmo. Senhor,

Tenho a honra de remeter a V. S. para aprezentar ao Illmo. Exmº Sr. Marechal Marquez de Campo Mayor o Mappa dos mortos e feridos que a Divizão do meu commando teve na acção do dia 13 do corrente em frente de Bayona; tendo ao mesmo tempo a satisfação de poder assegurar a S. S. que a conducta dos Corpos que a compoem foi a mais bizarra, não podendo deixar com tudo de particularizar o 2.º Batalhão do Regimento n.º 14 pella brilhante carga que executou debaixo do meu immediato commando, atacando o inimigo à baioneta pª poder desembarassar o 1.º Batalhão do mesmo regimento quando se vio obrigado a seder o terreno para evitar de ser involvido por huma força supperior de Voltigeurs, que o atacárão, os quaes voltarão caras precipitadamente perdendo a pozição, e deixando em poder do 2.º Batalhão alguns prizioneiros.


Meresse ser levado à prezença de S. Exª o modo distincto com q os Commandantes das duas Brigadas o Sr. Antº Hipolito Costa, e o Sr. J. Buchan prehencherão os seus deveres assim como a conducta dos Commandantes dos Corpos o Sr. Cor. Jorge de Avilez de n.º 2, o Sr. Cor. Luis Maria de n.º 10, o Major Rodrigo Vito Moreira
[Rodrigo Vito Pereira] Comandante interino de n.º 14 o Ten. Cor. Hill de n.º 4, do Cap. Pamplona graduado em Major do Bat. de Cassadores n.º 10, e a do Ten. Cor. Tulloh Commandante da Artilharia, o qual depois de se ter comportado com a intelligência do costume foi ferido gravemente.

Não devo deixar de rogar a V. S. queira por na prezença de S. Ex. que entre os bravos officiaes que ficarão no campo de honra o Capitão Urbano Xavier Henriques do Regimento n.º 14 que morreu à testa da sua Companhia era cazado, e que a sua infeliz viúva se faz credora da protecção de S. Ex.


Os Srs. Brigadeiros Costa e Buchan me aprezentarão os nomes dos indeviduos que debaixo das suas vistas tiverão mais ocazião de se poderem destinguir, dos quaes remeto relação para conhecimento de V. Ex.


Seria faltar ao meu dever se deixasse em esquecimento os nomes dos indeviduos que durante a acção, e dispozições para ela me assistirão como officiaes do estado mayor desta Divizão dando-me provas de entelligencia zello,e actividade pelo que tenho ahonra de os recomendar a S. Ex, sendo os seguintes =
O Ten. de Cav. D. Gastão da Camera –Ajd. de Campo do Exmo. Gen. Hamilton. O Ten. Joze Ferrira da Cunha = meu Ajudante d’Ordens. O Ten. do Exército de S.M.B. Grifits.

Além dos officiaes que constão das relações dadas pellos Srs. Commandantes de Brigada me foi recomendado no momento da acção o Alferes do Regimento n.º 14 António Lobo da Silva cujo Alferes se unio ao Batalhão de Cassadores com huma partida do mesmo Regimento.


Deos guarde a V. Sª.
Quartel de Moguerre, 16 de Dezembro de 1813
Illmo. Sr. Manoel de Brito Mozinho


P.S.: O Major Pereira commandava o 2.º Bat. do Regimento n.º 14 no momento em q mandei atacar à baioneta, e depois de ser ferido o major [Jacinto Alexandre] Travassos q com todo o valor foi ferido he q recahio o Commando do Regimento no dito Major Pereira.


Carlos Frederico Lecor

M. de C.


[AHM, 1.ª Divisão, 14.ª Secção, Caixa 243, n.º 7]

(Imagem acima, retirada da revista Highland Light Infantry Chronicle, Janeiro de 1914, p.40 e pode ser vista em http://books.google.pt/books?id=pCxtyaZr8ZQC)

Retificação (já corrigida nesta postagem), com agradecimento a Rui Pereira, em http://lecor.blogspot.pt/2010/09/retificacao-batalha-de-st-pierre.html .

26 de maio de 2009

Retrato, autor desconhecido


Encontrei este retrato do Marechal Carlos Frederico Lecor, no sítio da "Uruguay Educa", portal educativo [visite aqui]. É um Lecor mais velho, decerto após 1824 (tendo em vista o uniforme imperial brasileiro, a Imperial Ordem do Cruzeiro no peito e a Medalha da Cisplatina - a do Barão da Laguna, como também é chamada - em torno do seu pescoço). Não há outra informação acerca da fonte se não esta: Archivo Nacional de la Imagen, SODRE (Servicio Oficial de Difusión Radiotelevisión y Espectáculos).

Nota (31.7.09) - É de 1824 a primeira organização do Imperial Exército e, salvo erro, os uniformes e insígnias.

9 de maio de 2009

As Razões da 'Traição', ou porque Lecor passou a servir o novo Império do Brasil


Quem tem acompanhado este blogue, decerto já se terá deparado com uma das questões mais quentes acerca do homem Carlos Frederico Lecor:


Porque razão, em 1822, Lecor deixou de servir Portugal e passou a servir o novo Império Brasileiro?

Avancei, desde logo, algumas hipóteses, mas nada será melhor do que ler as próprias palavras do homem por trás da decisão.

A 1 de Junho de 1823, em Canelones, enquanto liderava o cerco a Montevidéu e aos remanescentes da Divisão de Voluntários Reais (então liderados por D. Álvaro da Costa), Carlos Frederico escreveu uma carta ao Ministro José Bonifácio Andrada e Silva.
Esta carta é um verdadeiro desabafo de alma, razão pela qual a transcrevo integralmente, pese embora a sua grande extensão, para que o caro leitor possa aferir e responder por si mesmo à pergunta.

Ela é transcrita a partir da obra Lecor e a Cisplatina do General Paulo Queirós Duarte, publicada pela Biblioteca do Exército. Está no volume II e vai das páginas 507 a 510. O 2.º e 3.º parágrafos são particularmente elucidativos à questão em mãos, mas toda a carta merece uma leitura.



Tive a honra de receber a muito lisongeira e polida Carta que V.Exa. se dignou distinguir-me, fazendo o favor, que devidamente preso, de se me dirigir particularmente e em confidência, e tratando-me com expressões que até, se eu as merecesse, seriam boas, para me encherem de vãs glórias, e a que não tenho outro direito, senão o que se funda no mais ardente desejo de que me venham bem; e como V.Exa. quando assim me fala tem por objeto principal a Glória das Armas de Sua Majestade Imperial, e a Dignidade e Independência do Grande Brasil, contemplando-me sobremaneira, mas com muita justiça, em me julgar empenhado intimamente, e com todas as minhas potências, em tão Grandiosa Empresa, não haverá para estranhar que seja eu tão franco e leal com V.Exa., como V.Exa. tão nobremente o foi comigo: no quadro que V.Exa. vai ver, achará o que eu sou, e quando me pintarem a V.Exa. com outras cores, poderá V.Exa. conhecer a diferença que há do original.


Quando eu renunciei aos interesses de um País, que me viu nascer, que me enchera de Honras, e onde outras me esperavam, e me liguei aos do Vasto Império do Brasil, tive em vista não só a justiça da Causa Sagrada que abraçava, mas o convencimento de que assim defendia os legítimos direitos do Herdeiro do Trono Português contra os planos evasivos do partido Espanhol, dominante nas Cortes de Lisboa, e porque no duro cativeiro de S.M.F. nada me parecia mais digno do que obedecer a Seu Augusto Filho, cujas virtudes e sublimes qualidades eu admirava: toda esta resolução, que é das que os homens da minha têmpera tomam uma só vez na vida, estava decidida a minha sorte, e quaisquer que fossem as alternativas da Política, elas já nada tinham comigo.


Então principiei para mim uma nova época na Carreira Política, e quase que me esqueci de todos os serviços que tinha rendido em mais de trinta anos de trabalho efetivo para, também, me esquecer dos sensabores e amarguras que eles me custaram, e se alguma vez recordava as contradições, que na minha complicada Comissão havia encontrado da parte de meus Subalternos, que me embaraçavam com uma Política oposta à minha; da parte do inimigo, que era necessário bater, e contemplar para que esta Província não ficasse um ermo, e nós todos por Canibais; da parte do passado Ministério pela impaciência com que ele, muito de longe do teatro da ação, queria forçar acontecimentos, que só tempo e paciência podiam fazer favoráveis, e porque alguma vez deu mais por vozes vagas, e acaso filhas de interesse particulares, do que pelas minhas informações oficiais; e da parte de vários outros agentes, que tiveram a influência de me mortificarem, era só para ter a consolação de dizer "bem, já tudo isto se acabou".


Esta não era a minha única satisfação, eu também cheguei a lisonjear-me, e V.Exa. me perdoará a presunção, de que sabida por S.M.I., e pelo seu Ilustrado Ministério a minha dedicação, e boa vontade, haviam os meus desvelos de procurar-me contentamentos na estação derradeira da minha existência, e não deixavam de me confirmar nesta persuasão documentos autênticos em Nome do Nosso Amável Imperador.


É verdade que várias Providências tomadas pela Repartição de V .Exa., e entre elas a da Comissão, que devia cuidar dos negócios deste País, ao passo que muito as respeitava, me causavam a maior penalidade; porque tinham um lado, que desgraçadamente foi o do maior e único efeito prejudicial aos Interesses do Império e de S.M., enquanto autorizam os outros, que me deviam respeitar, ou em mim deviam confiar, a faltar-me, e a pensarem, que eu era suspeito ao Ministério, e que ele desconfiava, ou fazia triste idéia das minhas operações; e sobre a Comissão, já que nada deverei ocultar a V.Exa., vem a propósito dizer que se ela não tem feito quanto mal podia, é porque eu o conheci em tempo, e o tenho, e continuarei a impedir.


O Síndico Procurador estava pelo seu lugar nas circunstâncias em que o considera a Comissão, e tudo o que ele me propusesse a bem do Império e desta Província seria por mim feito, como se fazia antes da Comissão; mas nem por isso aparecia a minha autoridade cerceada e vulnerável, nem estava ninguém fundado para julgar que S.M.I. tinha receios de mim.


O Brigadeiro Manoel Marques de Souza sempre manteve comigo a melhor inteligência, e se como Militar obedecia as minhas ordens, nunca por ele me foi proposta coisa que eu não aprovasse, em tudo isto porém era; conservada a ordem militar.


É bem certo que depois da Comissão, salva a minha quebra na opinião pública, se tem continuado o necessário equilíbrio entre mim, o Síndico Procurador e o Brigadeiro Marques; mas Exmo.Sr., há quem perdeu a cabeça na Comissão, porque esta o tirou da sua esfera, e desejarei que algum lance de firmeza da minha parte, e que opiniões absurdas me arrancaram, basta para acalmar a vertigem e assim me veja eu dispensado de desabonar, perante V.Exa., indivíduos que tanto devem à Nação, e que parece preferirem aos interesses dela os seus particulares: tudo isto porém eu ainda combinava, conhecendo, que em Política, posto que seja injusto, é prudente viver desconfiando em casos arriscados, e tomar providências de cautela, que o risco autorize, e por tanto naquelas circunstâncias do Brasil, eu me resignava a que se desconfiasse de um General europeu, que se achava à testa da Força européia, atacada de opiniões exaltadas, e peninsulares; quando porém chegou à minha mão a respeitável Carta Imperial, datada de vinte e oito de janeiro p.p., publicada no Diário do Governo n.º 53, fiquei aniquilado, e confesso a V.Exa. que naquele momento me julguei o homem mais infeliz do Universo; porque não podia evitar que o desagrado que S.M.I. me intimava fosse transcendente aos negócios públicos, a mim confiados, e ao melhor proveito do Seu Imperial Serviço, como já sucede, havendo-se aqui desenvolvido, desde aquela ocasião, um dispersível conciliábulo, cujos incansáveis trabalhos e diligências têm por fim declamar contra quantos eu faço, levar as Tropas à insubordinação e ao levantamento, exagerando-lhes a sua paciência e sofrimentos, e compadecendo-se farisaicamente das suas poucas comodidades, e forcejando por continuar a insurreição da gente da Campanha, louvando e detalhando os muitos melhoramentos de que esta Província é capaz, como são Universidades, Fábricas, Pontes, Canais e outras Grandezas e Estabelecimentos, que há na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos!!! e carregando a mim e ao Síndico Procurador a falta deles, como provam aos seus prosélitos, com o frisante contexto da veneranda citada Carta Imperial: V.Exa. diz bem que só com grandeza de alma e sacrifícios se levam ao cabo grandes projetos; porém, Exmo.Sr., o meu espírito não é tão forte, nem tão elevadas as minhas faculdades, que me não causassem o mais vivo sentimento as veementes reconvenções de S.M.I., mais ainda porque a minha consciência as não deixava recear; para ela é que eu apelei na minha angústia, e a direitura do meu procedimento me tem dado forças para esperar que o tempo e a mesma ordem dos acontecimentos convençam a S.M.I. e a V.Exa. de que, se eu não mereço elogios, é tão crítica a minha posição, que deve escusar-me de reprimenda. Em campo, e fazendo a Guerra àquelas mesmas Tropas, que comandei, que conduzi à Vitória, e que me granjeariam honras e considerações; necessitado a dividir-lhes as forças, porque de outro modo, se as minhas ainda agora são pequenas, muito menores seriam, se àquelas chegassem a reunir-se; obrigado a guardar uma Providência, incitada por mil brilhantes aparências, e poderosos aliciantes a repelir o nosso Governo. e tudo isto quando mais escassos eram os meios que eu tinha para o fazer; quando a sua longa estada neste País contra os seus engajamentos as trazia descontentes; sem pólvora; sem cartuchame; sem barracas; sem armamentos de reserva; porque a precipitação, com que saí de Montevidéu, para cumprir as ordens de S.M.I., nada disto me deixou tirar, e que por certo tiraria, como naquela ocasião disse ao Síndico Procurador, e ao Brigadeiro Manoel Marques, se não tivesse que satisfazer as desconfianças que de mim havia, e que a minha Carta a S.M.I., ainda Príncipe Regente, devia ter desvanecido, e sacrificar assim o tempo, que precisava para salvar os dois Batalhões de Libertos; para extrair da Praça quanto conviesse às minhas Tropas, e quanto cumpria subtrair-se às da Divisão, e para tomar várias outras providências, cuja falta cada dia ha de ir sendo mais sensível, e rodeado de outros mil embaraços, que talvez ainda me veja no caso particularizara V.Exa., quando acabe de me decidira não tomar sobre mim faltas alheias; e por cúmulo de males suspendido o aceite das minhas letras, de que ainda a nudez das Tropas se está ressentindo, e que maiores males teria causado a não serem os sacrifícios crédito de D.Tomás Garcia: são circunstâncias que se clamam para quem está no meio delas, ao menos aquele favor, que é indispensável para que ele desempenhe a Comissão que lhe está incumbida: a obsequiosa Carta de V.Exa. e a muito fiel informação, que o Coronel Flangini me tem dado dos esforços incansáveis de V.Exa. pelo Grande Brasil, e pelo Esplendor do Império e a segurança da generosa vontade com que V.Exa. deseja que lhe fale com franqueza, me tem animado a ser tão sincero com V.Exa. que não hei de deixar mal posta a confiança cavalheira com que V.Exa. me abona, eque serei muito feliz se a continuara merecer de V.Exa. para mim, e para as minhas informações, no que me empenha, não minha pessoal reputação, mas sim a das Armas de S.M.I., que tanto quero, e me interessa promover, e que não devo expor, nem exporei, sempre que esteja convencido de que elas podem sofrer um desar, que nas atuais circunstâncias do Brasil e deste Estado é prudente e até necessário evitar; embora me fosse aqui dito oficialmente "que a S.M.I. no es doloroso ningún sacrificio de Ias fuerzas que el Poderoso ha depositado en Sus Reales Manos", asserção que de qualquer modo tomada é para mim absolutamente falsa, e nada conforme ao conhecimento que tenho do Caráter Paternal de S.M.I., que se muito zela os interesses de seus súditos, e muito mais preza o sangue deles, e seguramente me demandaria a mais pequena gota vertida, se outro arbítrio a pudesse poupar; esta é a minha resolução, quais quer que sejam as opiniões das pessoas que por aqui pensem de outro modo: porque estão livres da responsabilidade que sobre mim pesa e, que se pesasse sobre elas, seriam menos pianistas e mais comedidas em criticar as minhas operações, até invocando o Nome de S.M.I. e do Ministério, para semearem nesta Província a divisão e o descontentamento, e acaso a reduzirem ao estado de desordem em que, para seus fins, a desejam, e que para desautorizarem o que os outros fazem, e dar-se importância, facilitam as coisas mais difíceis, porque têm o suficiente descaramento para não se envergonharem, quando o resultado é contra elas e as desmascara.


O meu fim é acertar, nem a outras fortunas eu aspiro, e par dar a V.Exa. disto prova mais convincente, fiz o que nenhum General deve fazer; consultei os meus subalternos em matérias de que o Comandante-Chefe nunca lhes deve dar satisfações, e sobre que, se ouve alguém direta, e positivamente, ou não tem plano, e obra ao acaso, ou arrisca tudo, porque franqueia o segredo das suas operações; e pela cópia, cujo original levo à Soberana Presença de S.M.I., pela Secretaria d'Estado dos Negócio da Guerra, verá V.Exa. qual é, sobre o procedimento que deve aqui haver, a opinião das pessoas que têm responsabilidade, que estão sobre os acontecimentos, que hão de trabalhar, e que têm toda a honra, meios e vontade para bem o fazer, e poderá V.Exa. compará-Ia com a charlatanaria das que só esperam tirar lucro da vitória, e não participar dos riscos e perigos dela.


Para concluir, só me resta dizer a V.Exa. que assim como assegurei a Sua Majestade Fidelíssima que havia de conseguir mais breve do que pensava, e sem grandes males, a Pacificação, que me estava encarregada, quando toda a gente, que enganava o Ministério, criticava a torto e a direita as minhas disposições, assim também espero, e não sem fundamento positivo, ver-me livre da Divisão de Voluntários Reais e restabelecer a boa ordem nesta Província, apesar da Comissão, dentro de pouco tempo, e sem grande efusão de sangue.



As reflexões que V.Exa. se serviu enviar-me não me são novas, como outras que a V.Exa. terei a honra de elevar; mas V.Exa. sabe que, nas circunstâncias em que eu me tenho achado, não pode, sem milagre, fazer-se tudo o que é preciso, e de que me ocuparei quanto caiba nas minhas forças e nos meios que estiverem à minha disposição.

5 de abril de 2009

Duas Cartas de Lecor Leiloadas o Ano Passado

Ao googlar o nosso amigo Lecor, naquilo que se torna já um hábito do qual será difícil me apartar no futuro, encontrei algo interessante e que se reporta ao sector privado da historiografia militar portuguesa.

No passado ano de 2008, a 8 de Julho, e pelo valor de €130 foram leiloadas duas cartas escritas por Carlos Frederico Lecor ao Marquês de Alorna, nos idos de 1801, ambas da Zibreira, na zona de Castelo Branco, uma a 26 de Abril e outra a 28 desse mesmo mês. A leiloeria foi a Palácio do Correio Velho e pode ser visitada aqui.

Desde já dando os parabéns a quem adquiriu estes dois documentos, copio aqui as suas descrições para memória futura. Seja quem for, tendo os dois documentos, já tem mais um documento lecoriano acerca da zona da Beira Baixa na Guerra de 1801 (das Laranjas, como lhe chamam) que o Arquivo Histórico Militar (que só tem um e está, aparentemente, 'refém', da empresa de digitalização e arquivo - tentei e não consegui ver, por razões esotéricas internas).


Leilão nº 195 - Leilão de Livros e Manuscritos - Lote 0515:

"1 - CARTA AO MARQUÊS DE ALORNA. Zebreira, 26 de Abril de 1801. In - 4º de 4 págs. Com descrição dos movimentos de tropas junto à fronteira e pedindo cartuchame para distribuir ás companhias de ordenanças. Refere ainda Salvaterra e Monfortinho. Lecor foi um destacado militar vencedor tanto nas guerras peninsulares como na Guerra do Rio da Prata, conquistando Montevideu. Veio a ser 1º barão e Visconde de Laguna, morrendo no Brasil.


2 - CARTA AO MARQUÊS DE ALORNA. Zebreira, 28 de Abril de 1801. In - 4º de 4 págs. Fala dos movimentos de tropas, da falta de sapatos dos homens, da necessidade de lhes dar mais que o soldo para os fazer avançar no estado em que estão e anuncia a partida para Badajoz. Cartas valiosas, escritas do distrito de Castelo Branco, pelo herói de várias batalhas peninsulares."

16 de março de 2009

Leituras Cibernáuticas IV - História da Campanha do Sul de 1827

Qualquer historiador amador e sem dinheiro (os profissionais e endinheirados também, na verdade, mas não é o meu caso) deverão estar sempre com o olho nas novidades do Google Livros e do Archive.org.

Ora, anteontem, encontrei a mais fresca novidade em torno de Lecor, uma preciosidade acerca da Guerra da Cisplatina (Esp.: Guerra del Brasil) de 1825-1828, escrita por Eunápio Deiró (o autor não consta da ficha do livro, mas identifiquei-o facilmente). Fundamentalmente, o livro versa sobre os acontecimentos de 1827 e sobre a batalha do Passo do Rosário (ou Ituizangó),em 27 de Fevereiro de 1827, uma pequena grande derrota.

Interessante mesmo é que este livro foi escrito por um Barbacenista, isto é, claramente um apoiante do Marquês de Barbacena, Felisberto Caldeira Brant Pontes de Oliveira Horta. (1772-1842) Não portanto um dos meus, pois eu sou, e o leitor já claramente percebeu, um Lecoriano. Defeitos pessoais e públicos à parte, ao menos Lecor era um soldado verdadeiro, enquanto o Barbacena era um bom diplomata, favorito da amante do Imperador, mas não, de facto, um soldado no verdadeiro sentido da palavra, muito menos um comandante.

Ora, na História Brasileira retunda ainda o frio encontro entre as duas personagens a 26 de Novembro de 1826, na Vila do Rio Grande, quando Lecor rendeu o comando do Exército do Sul a Barbacena, assim como a recusa posterior de D. Pedro I em receber Lecor.

Passaram 14 meses até que Lecor, que havia humildemente aguentado todo o desprezo que a Côrte lhe havia oferecido, torna ao comando do Exército do Sul, para gáudio, diga-se, da população gaúcha, que ao contrário da capital sabia agradecer.

Ora, o caríssimo leitor queira perdoar as minhas palavras, acaso seja barbacenista, ou até mesmo se não for, mas as ondas desta polémica chegam a este ano de 2009 e pela pena deste que vos escreve, não cessarão senão pela atribuição da verdadeira importância de Carlos Frederico Lecor, que, apesar de ter nascido em Portugal, serviu distintamente o Brasil quando o Brasil mais dele precisou.

História da Campanha do Sul em 1827 (Separata da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 3.º Trimestre, 1886)
Eunápio Deiró [visite aqui]

14 de março de 2009

Leituras Cibernáuticas III - Memoria das Medalhas e Condecorações Portuguezas


Memória das Medalhas e Condecorações Portuguezas e das Estrangeiras com Relação a Portugal [aqui]
Manuel Bernardo Lopes Fernandes
Academia Real de Ciências de Lisboa, Lisboa, 1861


Esta obra já estava disponível no Google Livros inserido na Revista da Academia, mas carecia das litografias, onde podemos ver as medalhas.
Nesta edição, uma espécie de separata, encontramos as imagens das várias medalhas, de acordo com os seus desenhos originais, de Lei.

A visitar, baixar e guardar.

Na imagem, a Estrela de Oiro de Montevidéu [vide pp.85.89 para saber mais].

11 de março de 2009

Retrato a Óleo, Miguel Benzo


Encontrei recentemente este pormenor do Óleo de Miguel Benzo, que está no Museu Histórico Nacional de Montevidéu, representando o Tenente General Carlos Frederico Lecor, por alturas do auge da sua carreira, entre 1820 e 1824, rondando os 60 anos de idade.

Poderão ver mais no sítio Kalipedia, em http://uy.kalipedia.com [artigo sobre Lecor].

De notar a Banda, azul, da Ordem da Torre e Espada, assim como a placa de peito e colar, indicando que é Grã-Cruz (Honorário).
No peito, em cima, a placa de Comendador da Ordem de Aviz, sendo que detinha a Comenda do Sardoal (Alentejo).

O quadro a óleo é maior, com um retrato de D. João VI à direita, e a cidade de Montevidéu na janela à esquerda. Também se pode ver, no quadro completo, a espada de Lecor, provavelmente, a que ele mandou fazer no Arsenal Real em 1815, quando foi nomeado Comandante da Divisão de Voluntários Reais do Príncipe.

7 de março de 2009

'Arvorado em general', Divisão de Observação de Beira Baixa, o primeiro comando de Lecor (Fevereiro de 1809)





A 20 de Novembro de 1808, quase 3 meses após ter retornado de Plymouth integrado na Leal Legião Lusitana, Carlos Frederico é nomeado Coronel do Regimento de Infantaria n.º 23, de Almeida.
No adro ainda ia o seu trabalho nesse regimento - buscando pô-lo em condições - quando se vê nomeado comandante da Beira Baixa, em 25 de Janeiro de 1809, mais precisamente Comandante da Divisão d'Observação da Beira Baixa, integrada no maior Exército d'Entre Tejo e Mondego (Tenente General António José de Miranda Henriques), juntamente com a formação-irmã, a Divisão d'Observação da Beira Alta (Marechal de Campo [hoje seria Major General] Bacelar).

Após ter sido nomeado para comandar a Beira Baixa, por Ofício de 25 de Janeiro, assinado por D. Miguel Pereira Forjaz. o Coronel Carlos Frederico Lecor deslocou-se, no início de Fevereiro, de Almeida (onde comandou brevemente o Infantaria 23) para a Idanha. Lecor iria substituir o brigadeiro Francisco da Silveira Pinto da Fonseca, nomeado para o governo de armas do Minho, onde iria ter um papel importante durante a segunda invasão francesa sobre o norte de Portugal.

[na foto, ao topo, o Rio Pônsul, junto a Idanha-a-Velha].

A província era de extrema importância, na medida em que o Coronel Lecor se via encarregado da defesa do teatro onde apenas há cerca de 14 meses, Junot havia entrado em Portugal. Como o próprio Lecor refere, na sua carta de aceitação e agradecimento a D. Miguel Pereira Forjaz, datada de 2 de Fevereiro, "Lembre-se V. Ex.ª que me arvora em General e que as minhas circunstâncias não são para isso".

Com pouco menos de um mês nesse comando, Lecor enviou uma carta ao Secretário de Estado dos Negócios da Guerra, D. Miguel Pereira Forjaz, apresentando os problemas e prescrevendo uma terapeutica (curiosamente, ou não, a mesma que Arthur Wellesley prescreverá, com sucesso, para a defesa de Portugal em 1810): a negação de sustento às tropas francesas.
Entre outros elementos, é notório o desfazamento entre os militares e os civis, problema principal que Lecor enumera. Com o benefício, no entanto, de uma linguagem elegante e clara, Lecor apresenta em pleno o potencial que o levará a mais altos voos e consistentemente a deter comandos nesta área, talvez a principal entrada de acesso a Lisboa, paralela ao Tejo.

Aqui fica, pois, a carta que amanhã fará 200 anos de idade, reportando a situação da Beira Baixa e, concerteza, a disposição geral dos Portugueses:

Illmo e Exmo. Senhor,

A presunção em que acham os Povos da Beira Baixa, aonde tenho a honra de comandar, que o perigo está passado, e que o Inimigo não tornará a invadir esta Província, faz com que o patriotismo e actividade se desenvolva mui pouco nestas Povoações, lembrando-se de Privilégios, e fugindo a darem transportes aos accentos, e escondendo o pão supérfluo que ainda têm: faz-se muito necessário ordens positivas sobre tão importante objecto, determinando S.A.R. = 1.º Que cessem na actual situação todos os Privilégios em todas as classes de cidadãos principiando pela Tropa de Linha, e Milícias = 2.º Que todas as Autoridades Constituídas Eclesiásticas, Civis e Militares, aproximando-se o Inimigo se devem retirar às Montanhas, sem o que é dificultoso fazer mover os Povos, valendo-se o Inimigo as mesmas Autoridades para lhe fazerem aprontar os Mantimentos que lhe são necessários como fizeram em Portugal e estão praticando em Espanha = 3.º Que se obrigue a todas as famílias a depositarem o pão, que conservam para o seu sustento, e os seus gados nas Montanhas, ou terras que lhes são vizinhas desde Alpedrinha até a Serra do Muradal, e desta até Vila Velha, para onde os Povos se devem recolher logo que o Inimigo pretenda entrar com maiores forças, porque de outra sorte acharão em cada Povo assão (?) nos Depósitos particulares de cada família pão suficiente para sustentarem as suas Colunas umas poucas semanas = 4.º Todo o pão dos celeiros e sobras dos particulares se deve reunir em um Depósito geral para fornecimento da Tropa, fora do alcance de um golpe de mão, parecendo-me o mais conveniente a Sobreira Formosa.
Todas estas disposições merecem a atenção de S.A.R., pois marchando o Inimigo sem Armazéns, o meio mais forte de resistência que lhe poderemos opor será embaraçando que lhe encontre subsistência.
Tenho calculado que na Beira Baixa se podem sustentar 20 mil homens dois meses com provimentos particulares, por consequência é de primeira necessidade obrigar que se façam os Depósitos particulares e gerais nos Pontos que a Natureza defende, e que a Tropa e ordenanças podem guardar.
Acabo de receber um Ofício do general Costa [Cuesta] pelo oficial que mandei àquele Exército tomar conhecimento das disposições dos Espanhóis, e Franceses. O mesmo Costa me dá a conhecer o pouco contente que está do Exército Português o não auxiliar. À presença de V.Exª mando o mesmo oficial, o qual pode informar a V.Exª das miudezas [meudezas] e particulares que ali presenciou. O Exército do dito General Costa vai-se reforçando, e assegura-me o dito oficial que já tem 5 mil homens de Cavalaria bem armados, e vestidos.
Espero que S.A.R. determine com toda a brevidade se executem as providências que pondero para bem da defesa desta Província, a fim de que haja tempo de poder executar todos estes arranjos, sem os quais toda a Resistência Militar não bastará para suster a entrada do Inimigo.

Deus Guarde a V. Exª (...)

Idanha, 3 de Março de 1809

Illmo e Exmo Sr. D. Miguel Pereira Forjaz

Carlos Frederico Lecor(Transcrição da carta disponível no Arquivo Histórico Militar, AHM-DIV-1-14-095-54, com adaptação ao Português contemporâneo)


* * *

Ordem de Batalha
Em finais de Março, a Divisão da Beira Baixa, como era tratada à guisa de diminutivo, tinha as seguintes forças, em duas linhas:


1.ª LINHA [Margem do rio Erges, a fronteira com Espanha]
Constituído inteiramente por 6 Companhias de Caçadores do Monte, com o complemento de 102 homens cada, totalizando 612. Este tipo de companhias eram formadas por Ordenanças voluntários ou escolhidos pelo excelente conhecimento do terreno da Raia.
Estando baseados em aldeias e vilas, formavam então a 1.ª linha, com a seguinte distribuição de efectivos, de Sul para Norte:

Malpica (50), Monforte (52), Rosmaninhal (102), Segura (102), Salvaterra do Extremo (102), Penagarcia (30) Aranhas (72) Guadrazães (102)

As Companhias de Caçadores do Monte eram formadas apenas em tempo de guerra, a partir de voluntários, sendo as patentes dos seus oficiais assinadas pelo comandante militar da região. A sua utilização em 1809 teve um precedente, em 1801, na Guerra das Laranjas, não só na Beira Baixa (que não viu acção), mas na Beira Alta e em Trás-os-Montes. Em 1801, Lecor era aliás Capitão Ajudante d'Ordens do Marquês de Alorna, na Legião de Tropas Ligeiras que guarneceu também este mesmíssimo teatro de operações.

2.ª LINHA [Margem do rio Pônsul]
Constituído pela Infantaria de linha, Caçadores e Regimentos de Milícia locais, perfazia 4,284 homens, distribuidos assim, também de Sul para Norte:

Cebolaes - Batalhão de Caçadores n.º 4 [486]
Castelo Branco - Batalhão do Regimento de Infantaria n.º 1 [194 efectivos]
& Regimento de Milícias de Castelo Branco [308]
Escalos de Baixo - Batalhão de Caçadores n.º 5 [227]
Idanha-a-Nova - Batalhão de Caçadores n.º 2 [366]
Idanha-a-Velha - Batalhão de Caçadores n.º 1 [552]
& Regimento de Milícias da Idanha-a-Nova [1,101]
Penamacor - Regimento de Milícias da Covilhã [1,050]

Cavalaria
3 Esquadrões, em Zibreira, Alcafozes e Idanha-a-Nova, cada um destes com pequenos destacamentos em 11 aldeias e vilas [370]

Artilharia
Uma Companhia de Caçadores do Monte, mais a sul, em Vila Velha do Ródão, com 102 homens, defendia uma linha de postos constituída por 58 artilheiros em quatro áreas, de Sul para Norte, Vila Velha, Perdigão, Talhadas & Muradal.


Esta Divisão estava posicionada essencialmente de forma defensiva, com os Caçadores do Monte servindo de piquetes altamente móveis, reconhecendo activamente. Mais para dentro, em torno do Quartel-General de Lecor em Idanha-a-Nova, estavam as unidades de linha e as Milícias, o grosso das forças.

22 de fevereiro de 2009

Carlos Frederico Lecor: The Making of a Portuguese General

Embora este artigo tenha sido publicado no final do ano passado, já perfazendo quase 2 meses, esta é tão boa altura quanto qualquer outra para o anunciar aqui. É o primeiro de dois artigos que escrevi em língua inglesa para o excelente sítio Napoleon Series, intitulado "Carlos Frederico Lecor: The Making of a Portuguese General". Este primeiro refere-se aos anos enquanto subalterno (até Tenente), e reporta-se aos anos de 1793 a 1797. O segundo, a escrever ainda, irá centrar-se nos anos de 1797 a 1808, período esse que termina com Lecor promovido a Coronel de Infantaria 23, no renovado Exército Português.

Espero que gostem.

http://www.napoleon-series.org/research/biographies/Portugal/Lecor/c_Lecor.html

21 de fevereiro de 2009

Um Livro a comprar

Paulo Estrela, Ordens e Condecorações Portuguesas 1793-1824,
Lisboa, Tribuna da História, 2009.

Definitivamente um livro a comprar, pela pesquisa exaustiva e bem entregue ao leitor, pela ilustração profusa (na capa, a Medalha de Comando da Guerra Peninsular - por 5 acções - atribuída a D. José Luís de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos (1785-1855), 1º Conde de Vila Real) e pela lista de medalhados, no final.

A meu ver, e puxando a minha sardinha à respectiva brasa, só faltava uma imagem de algum quadro de Lecor, quem sabe o de Miguel Benzo, em Montevidéu, com Lecor usando a sua banda da Torre e Espada ... Mas também era só mesmo isso que faltava (digo eu!), pois de resto enche as medidas a qualquer amante de Falerística e História Militar.

Uma fonte biográfica de 1836: A mais antiga?


Após algum tempo de recesso, volto ao vosso convívio com a mais antiga fonte biográfica de Lecor (que eu saiba), publicada na Biographie Universelle et Portative des Contemporains (tomo III), em 1836, o mesmo ano em que Lecor faleceu:


(decidi apenas colocar uma parte, acerca da parte menos conhecida da vida de Lecor)

LECOR (Charles-Frédéric), général portugais, né en Algarve, reçut sa première éducation en Hollande, d’où son père était originaire [na verdade, o pai, Louis Pierre Lecor, era originário de Paris]. Il sé destina d’abord au commerce, mais il embrassa fort jeune encore l’état militaire, et parvint en peu d’années au rang de capitaine. Il dut son avancement autant à son mérite qu’à la protection du marquis d’Alorna, chef de la légion de troupes légères, qui y admit le jeune Lecor. A l’époque de l’entrée de l’armée française à Lisbonne, en 1807, M. Lecor était major [era, de facto, Tenente Coronel] dans cette légion et aide-de-camp du marquis d’Alorna, alors gouverneur de la province d’Alantejo, qui avait en lui une entière confiance, non seulement pour tout ce qui regardait le service militaire, mais encore pour des affaires personelles et confidentielles. Pendant un court voyage que son chef fit à Estremoz, pour y passer en revue les troupes portugaises destinées par le général Junot à former le corps qui devait se rendre en France, M. Lecor évita adroitement d’accompagner son général, en pretextant des affaires dont celui-ci l’avait chargé et qui n’étaient pas encore terminées. Pendant l’absence du marquis il s’embarqua secrètement pour l’Angleterre. Cette conduite peu franche envers son ami et son protecteur, dont le cáractère était plein de loyauté, fut universellement désapprouvée par ceux-là même qui partageaient la répugnance que cet officier montra pour le service français. Revenu en Portugal par suite de l’evacuation du pays par l’armée française en vertu de la convention de Cintra, M. Lecor servit avec distinction dans l’armée anglo portugaise ; il commandait une brigade à l’affaire du Bussaco, s’y distingua par son courage calme et sa présence d’esprit, et fut un des officiers portugais dont le maréchal Beresford fit le plus de cas, et auxquelles il confia, dès la premiere organisation de l’armée portugaise, les plus importants commandements. (...)Resta saber quais as fontes que o autor usou (entre vários que compuseram o dicionário). Este texto, em alguns dos seus elementos, serve de base a apontamentos biográficos futuros, nomeadamente colocando-o como natural do Algarve, como infantil viajante à Holanda, destinado ao comércio, etc.
A vermelho, uma versão da forma como Lecor se terá separado do seu general (Alorna) em 1808, fugindo depois para Inglaterra. Esta versão não aparece replicada em outras fontes subsequentes.


Atualização [19/4/2013]: Leia o livro no GoogleLivros (p.223)