14 de julho de 2025

Carta de D. Quitéria Luísa Marina Lecor a D. Miguel Pereira Forjaz (Faro, 26 de novembro de 1819)

Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor

A bondade de VE é quem segura o perdão do meu atrevimento. Eu sou mãe dos quatro lecores que vossa excelência (VE) muito bem conhece, e até estou persuadida que eles merecem a honra da Amizade de VE, e recebendo eu carta do meu filho o tenente general barão de Laguna, atualmente comandante do exército de Montevidéu, nela me pede lhe mande seu sobrinho Cristiano Frederico Lecor Buys, meu amado neto, julgo com o plano de junto a si o fazer seguir a carreira militar, eu de boa vontade sacrifico o particular afeto que lhe tenho, só para que ele vá ser útil à pátria e a um tão benigno soberano, sendo sempre os meus sentimentos se mais filhos tivesse mais empregaria no Serviço de sua Majestade. Porém, excelentíssimo senhor, não estranhe VE que uma extremosa avó procure a segurança e o bom comado [cómodo?] da passagem de uma longa viagem, a um neto a quem adoro. Consta-me que uma embarcação de guerra se prepara para fazer viagem para o Rio de Janeiro, sendo assim vou por esta pedir a VE por graça especial a sua mercê de um aviso para o comandante da embarcação que for, lhe dar a sua passagem, só assim ficará este coração tranquilo pelo livrá-lo daquela parte do perigo de inimigo (que não é pequeno) e quando isto se encontre com as disposições de VE (o que não suponho) terei paciência – expô-lo-ei a todos os perigos, só por satisfazer os desejos de meu filho. Os meus [meios?] de ir servir a pátria e ao seu bom rei aonde dele mais // necessita. Torno a pedir a VE mil perdões pela minha liberdade, por uma parte, pelo excessivo afeto ao viajante, e por outra pelo meu natural patriotismo.

Sou com todo o respeito

De VE

Muito atenta veneradora [?] criada

Faro, 26 de novembro 1819

D. Quitéria Luiza Marina Lecor

Illmo. e exmo. Sr. D. Miguel Pereira Forjaz


Respondeu-se-lhe que não haveria dúvida em que fosse na Vasco da Gama.

Em 2 de dezembro 1819.


Fonte

Arquivo Histórico Ultramarino, AHU-ACL-CU-065, Caixa 2, Documento 1030


Maria Leocádia Leonor nasceu a 3 de setembro de 1744, em Portimão, filha de Nicolau Krusse, mercador de Hamburgo, e de D. Catarina Maria Buys. Casou com Luís Pedro Lecor em Lisboa, no bairro de Santos, a 3 de fevereiro de 1761.

Deste casamento nasceram Carlos Frederico, em 1764, João Pedro, em 1766, António Pedro, em 1768, e Jorge Frederico e Maria Leocádia Leonor. Algures na década de 1770, foi viver para Faro. É de crer a forte possibilidade do seu marido ter falecido algures nesta altura (ou saído da vida da esposa e família), porque carece de presença na vida pública das redes familiares dos Krusse, Buys e Lecor no Algarve. Tinha 75 anos à altura da carta.

Cristiano Frederico Lecor Buys, neto de D. Quitéria, nasceu a 22 de julho de 1797 em Faro, filho de João Pedro Buys e de Maria Leocádia Leonor Lecor (filha de D. Quitéria e irmã dos “quatro lecores”). Em 1822 era cadete, tendo servido no Exército brasileiro até à sua morte em 1882, reformado no posto de major. Tinha 22 anos à altura da carta.