18 de maio de 2008

A Lenda da Ponte sobre o Zêzere (II)


O caro leitor, permitindo-me que retome a questão da ponte de barcas sobre o rio Zezere, sabe decerto que toda a lenda tem o seu fundo de verdade, ou como se costuma dizer, onde há fumo, há fogo. Já verificámos que Lecor estava presente na área, mas com ordens que não passavam pela destruição de coisa alguma, mas o reconhecimento em busca da vanguarda de Junot. Ao descobrir essa vanguarda, pôs-se em marcha para Lisboa.

Mas de facto, onde há lenda, é porque há elementos, pelo menos dois, que coincidem no espaço e no tempo, convergindo e fundindo-se numa história.

Ora o exército de Junot, que virá a tomar o título de Exército de Portugal daí por um mês, já em Lisboa, teve realmente uma oposição feroz aquando da invasão - o Tempo. Passando por dificuldades até Abrantes e Punhete, principalmente a artilharia, mas em geral todas as armas, vem a vanguarda francesa descobrir que a célebre ponte de barcas sobre o Zêzere estava destruída, não pelo tenente-coronel Lecor, mas pelo próprio rio.

A ponte de barcas havia sido levantada aquando da Guerra das Laranjas, em 1801, e frequentemente acabava destruída pelo rio no pleno das chuvas de inverno. Várias vezes, de 1801 a 1807, a engenharia militar portuguesa apresenta os seus orçamentos para uma nova reconstrução. Lá se reconstruia e logo as chuvas retomavam a ofensiva anual.

Os Franceses, ao detectarem a ponte destruída, encarregaram o capitão Mezeur, um grupo de sapadores e mineiros catalães e também um destacamento francês, para que a reparassem. Tanto Maximilien Foy como Acúrsio das Neves indicam que as operações de reparação duraram a maior parte desse dia, atrasando de facto as forças franco-castelhanas. A força do rio Zêzere, assim como a subidas das suas águas, tornou a misssão extremamente difícil, causando algumas baixas entre os trabalhadores. A reparação da ponte só se dá por finda, após já metade das forças invasoras terem passado o rio de barco.

Acúrcio das Neves, dando-nos o benefício de o ler desde 1811, tão próximo dos acontecimentos, desmente uma versão circulada em que muitos franceses haviam morrido afogados durante as operações de reparação. Serve isto para nos mostrar o poder da lenda, ou do boato, consoante estamos longe ou perto no tempo. De facto, poucos invasores terão morrido afogados, mas do pouco a imaginação faz muitos.

Pela mesma altura em que a ponte era reparada, Lecor, o nosso heroi, estava em novo reconhecimento, já após ter avisado o governo. Tinha por missão continuar a avaliação do exército inimigo. Do Cartaxo, após ter ido à Golegã, relatou que o inimigo se encontrava ainda em Punhete e não é provável que chegue a Santarém antes do próximo dia. Acrescenta que os campos da Golegã estavam impraticáveis.

Esta mensagem será já recebida pelo Governo, embarcado no Tejo, esperando ventos para o Brasil.

Parte I em http://lecor.blogspot.pt/2008/05/o-mito-da-ponte-sobre-o-zzere.html

Sem comentários: